quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Tempo de esperar

As férias escolares já estão acabando. Dessa vez passaram rápido demais; duraram menos do que os segundos que o filho caçula precisa pra cair, no intervalo entre duas piscadas. Ontem à noite comecei o trabalho de etiquetar lápis, canetas, giz de cera. Um por um, pede a escola sem perdoar minha caligrafia capenga. O pior ainda não comecei que será encapar uma caixa. Uma caixa só, poxa. Nem posso me queixar dessa vida de boemia. Minha mãe encapava cadernos e livros todos os anos, de três filhas.
Tive de fazer o serviço às escondidas, depois que a menina foi dormir. De dia, quando ameacei começar a jornada, ela se assanhou toda, tão feliz que está de estrear na escola. Os olhos brilham frente ao baldinho de areia, dos mais simples que se possa encontrar nas papelarias do centro. “E o estojo de princesas, é meu?” pergunta sem se perceber repetitiva. Absolutamente tudo naquela sacola reluz a ouro pra ela. Etiquetas vazias, inclusive.
A escola fica em frente à nossa casa, o que para as crianças é um privilégio. Todos os dias, durante as férias, ela olhava pela sacada para acompanhar a reforma do playground. Afinal, sonha brincar com o baldinho roxo na areia. Ela quer tirar os sapatos e afundar os dedos gordinhos no colchão de grãos microscópicos de onde o vidraceiro tira vidro. Já a menina tira diversão pura, cristalina. Não dá para competir.
Verdade seja dita, talvez eu estivesse trabalhando fora caso o destino houvesse seguido outro caminho. Ano passado sinalizou que aconteceria, mas ainda não foi hora. Quando tiver de ser, será.  Ah, se além de falar a escrita suspirasse! Far-me-ia um grande favor. Em compensação, terei a oportunidade de vê-la entrar pelo portão da Rua Uruguaiana calçando os tênis de cano alto em seu primeiro dia de aula de todos os tempos. Uma cena que se perderá na memória de um senhor chamado tempo, mas não na minha.
Entre um parágrafo e outro desse texto, faço intervalos pra brincar de esconde-esconde com a menina. Ela quer emendar pega-pega, mas isso já não posso antes de preparar nosso almoço. Logo o bebê acorda e o mais velho termina de derrotar o time do vídeo game em uma partida de futebol que não pode, virtualmente, ir para prorrogação. Peço licença e saio. Quem sabe volte depois. A tarde sempre promete.